Exercício - Bloco 5
Escreva um texto de cerca de vinte linhas que corporize o esquema ficcional sintetizado por Jorge de Sena na Adenda temática A (e que diz respeito ao romance Oriente-Expresso de Graham Greene). Pode, no entanto, substituir o ambiente exterior ao comboio – que prefigura a iminência da Segunda Grande Guerra Mundial – por um outro igualmente revelador de uma imensa e densa clivagem.
Exercício:
O comboio entrou lentamente na estação caótica. Pessoas acotovelavam-se correndo de um lado para o outro, crianças choravam, o homem do realejo tocava, um cego pedia esmola, gritando, encostado à porta aberta. Todos temiam a onda que se aproximava e que iria destruir tudo à sua passagem, não deixando uma folha verde sobre a terra. Todos esperavam o comboio que os levaria para longe da destruição, a procurar noutro lado uma outra forma para recomeçarem a vida, o primeiro dia do resto das suas vidas.
Das janelas da primeira carruagem o grupo olhava, imóvel, a enorme confusão do exterior. O ruído chegava abafado pelos vidros duplos, a própria visão era desfocada pela névoa que envolvia a estação, como um véu. Cada um deles transportava o seu próprio inferno pessoal, o seu caos interior, que o do exterior parecia apaziguar.
Viajava naquela carruagem, um grupo heterogéneo, o casal que já se amara e agora se odiava, a mãe dela, senhora idosa desesperada com a passagem do tempo, inundada pela angústia de tudo o que podia ter sido e não fora, o pai dele, atormentado pelas visões da sua passagem pela guerra, dos homens que vira agonizar à sua frente, sem nada poder fazer. No banco da frente recostava-se, ensimesmada, a adolescente mergulhada nas hesitações da idade, nos dramas do crescimento.
A mole humana do exterior aproximou-se imediatamente do comboio assim que ele estacou. Todos queriam entrar, fugir, escapar o mais depressa possível à nuvem de gafanhotos que, qual praga do Egipto, se aproximava para destruir tudo, todas as colheitas, todo o trabalho de vidas.
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